sábado, 3 de novembro de 2012

Raízes sociais da violência

Dr. Drauzio Varella
Tv Escola



                     Violência é uma doença epidêmica, contagiosa e de múltiplas causas. A analise que a sociedade costuma fazer dela se baseia em fatores emocionais, quase sempre gerados por crime chocante, falta de segurança nas ruas, preconceito social ou discriminação. os estudos científicos pouco pesam na definição da política de combate à criminalidade, apesar de terem desenvolvido métodos mais precisos para avaliar a influência de certos fatores associados às raízes sociais da violência urbana. Atribuí-la à superpopulação dos grandes centros pode ser precipitado. Nada indica que a agressividade aumenta quando os espaços reservados a cada indivíduo diminuem. Em Tóquio, apesar da alta densidade demográfica, uma senhora pode andar pelas ruas à noite sem ser molestada.
                      Pode parecer estranho, mas experiências realizadas nos Estados Unidos com macacos japoneses e, na Holanda, com chimpanzés apontam que, mantidos em cativeiro em espaços agressivos. Postos em liberdade, a agressividade aflorava mais intensa. No pavilhão Cinco do Carandiru, em São Paulo, o mais lotado da cadeia, o número de assassinatos era infinitamente menor que os ocorridos em outros pavilhões menos povoados.
                      Diferenças sociais e desestruturação da família
                      A desigualdade social, geralmente, é o argumento mais aceito para justificar a violência. De fato, a má distribuição de renda pode favorecer a disseminação da criminalidade. Ninguém discute: sociedades desiguais tendem a ser mais violentas. Não só a pobreza mas também a falta de perspectivas podem induzir a comportamentos agressivos. No entanto, as diferenças sociais não explicam por que em lugares como a Suécia, em que as desigualdades são pequenas, a violência cresceu na mesma proporção com que diminuiu nos grandes centros dos Estados Unidos, onde a concentração de renda se agravou ultimamente. Não explicam por que, numa mesma família pobre, só alguns desrespeitam as regras de convivência social, nem por que filhos de gente abastada adotam comportamentos antissociais.
                      Outro aspecto importante é a atual desestruturação das famílias. No mundo todo, crescem filhos criados sem apoio  paterno. Muitas mães, especialmente no Brasil, são adolescentes. Estudos mostram que os filhos dessas jovens apresentam probabilidade maior de abandono, maus-tratos e espancamento domestico. Sobrecarregadas, as mães abandonam os estudos, não arranjam emprego e, obrigadas a arcar com as despesas, vêem reduzido o poder aquisitivo de suas famílias. Além disso, crianças nascidas com maior venerabilidade para desenvolver comportamentos agressivos e criadas por mães despreparadas para educá-las com coerência estão sujeitas a se tornar emocionalmente reativadas e impulsivas, condições que embutem alto risco de violência.
                      Prevenção e tratamento 
                      Violência, de fato, é uma doença com múltiplos fatores de risco. Estudos científicos permitem identificar três deles na formação de personalidades com maior inclinação ao comportamento agressivo: experiências de abuso sexual, espancamento, humilhação e desprezo nos primeiros anos de vida; distanciamento de valores sociais altruístico, de formação moral ou limites de disciplina; associação com grupos portadores de comportamento antissocial.
                       Combater essa doença pressupõe a aplicação de estratégias efetivas de prevenção e tratamento. Não é fácil construir uma sociedade igualitária que evite a ruptura dos laços familiares  eduque de forma adequada as crianças, diga não as drogas, encontre alternativas às cadeias, acabe com as armas e aplique justiça com isenção. Não existem soluções mágicas. Elas dependem do envolvimento de cada um de nós na educação das crianças nascidas na periferia do tecido social. Enquanto não aprendemos a orientar os pais e a oferecer-lhes medidas preventivas para que evitem ter filhos que não serão capazes de criar, cabe a nós a responsabilidade de integrar essas crianças na sociedade por meio de educação formal de bom nível, práticas e oportunidade de desenvolvimento artístico.
                       Drogas, armas e mídia 
                       No entanto, as ideias de impunidade e encarceramento são indissociáveis. Prender não garante obrigatoriamente reabilitação. Na maioria dos casos, o criminoso acaba estabelecendo na prisão conexões sólidas com o mundo do crime e volta a delinquir quando posto em liberdade. E o que dizer dos criminosos de colarinho branco que raramente são condenados, ou dos dignitários públicos que deslizam pela trama esgarçada das leis?
                      Outro fator importante no quadro da violência é a alta concentração de armamentos em determinadas áreas. A maior parte deles, obtida ilegalmente, transmite a seus portadores a ilusão de segurança, proteção e respeito. Para os que dependem dessas armas para enfrentar a polícia ou quadrilhas rivais, elas são símbolo de força e poder. Em ambos os casos, podem intensificar as reações violentas e os ferimentos letais.
                      Ninguém discute que as drogas - o tráfico e o consumo - influem nos comportamentos violentos, mas é fundamental analisar a revolução que o crack representou nesse universo. Antes dele, a cocaína era comercializada em pó, custava caro e era destruída por pequeno número de traficantes mais velhos. O crack democratizou o mercado. Os mais velhos experientes solucionados de conflitos, foram substituídos por jovens com tendência a resolver contendas com mais agressividade e impaciência.
                      Não se pode, ainda, esquecer o papel da mídia na divulgação de comportamentos violentos - de inocentes desenhos animados a programas de mundo-cão, cenas de caça a bandidos, arbitrariamente cometidas por policiais e revoltas nos presídios. Numa rebelião de presos, uma das primeiras exigências é a presença da televisão. demonstração de poder, garantia de proteção ou direito a alguns minutos de fama? Difícil dizer. Relatório publicado por associações médicas americanas concluiu que existe " uma conexão causal entre a violência na mídia e o comportamento agressivo de certas crianças".  

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